Café: cultura da prevenção
Atuamos sempre de forma reativa e não preventiva, deixando de assumir como agentes públicos, do setor e do mercado nossas responsabilidades

Inadmissível é, sem dúvida, a melhor palavra para definir mais um caso de fraude, sonegação fiscal e atuação criminosa na comercialização do produto mais importante da economia capixaba: o café. Quatro anos depois, a história se repete. Mais ilegalidades surgem, mais rombos aparecem, mais esquemas são descobertos.
A constatação torna inevitável a pergunta: até quando agiremos apenas “cortando o rabo de uma lagartixa”, que sempre volta a crescer, como bem disse o editorial de A GAZETA em 15 de junho?
Temos diante de nós, na verdade, um jacaré, voraz, mordaz e destemido, principalmente por não ver à sua frente nenhuma ameaça ou resistência consistente. Atuamos sempre de forma reativa e não preventiva, deixando de assumir como agentes públicos, do setor e do mercado nossas responsabilidades.
Intensificar a fiscalização é um dos pontos cruciais. Antes de autorizar a operação de uma empresa do setor, não caberia uma sindicância mais apurada, avaliando local, estrutura, capacidade operacional e de pessoal, idoneidade, entre outros pontos?
Verificar a procedência do café na nota – o conilon, por exemplo, é produzido quase exclusivamente pelo Espírito Santo, Bahia, Rondônia e uma menor quantidade por São Paulo – é um procedimento simples para averiguar possíveis irregularidades e, se for o caso, bloquear o crédito de ICMS para apurar a situação.
Divulgar os nomes das empresas envolvidas também é indispensável, afinal é preciso saber quem comete crimes, tanto para separar o joio do trigo como para alertar o mercado como um todo.
Não seria também a hora de termos uma delegacia especializada em fraudes e crimes fiscais para contribuir para extirpar a banda podre que prejudica a imagem e os resultados do setor como um todo e priva os já minguados cofres públicos do recebimento de impostos?
Neste sentido, sindicatos rurais, entidades e governo não deveriam também trabalhar na conscientização dos produtores sobre sua co-participação nos crimes ao vender o café sem nota, prejudicando sua própria comunidade que acaba privada de investimentos em saúde e educação, por exemplo?
O mesmo vale para a indústria que, ao comprar de empresas criminosas ou de fachada, compactua com o crime.
Fato é que se não houver uma mobilização forte e urgente o jacaré crescerá e ganhará ainda mais força. Uma decisão do STF pelo retorno do Funrural, um imposto federal de 2,25% cuja obrigação de recolhimento é daquele que compra o café do produtor, é mais uma brecha para atuação ilícita, se não for devidamente fiscalizado.
Em resumo, o que queremos é uma mudança de cultura em que poderíamos utilizar uma metáfora muito comum na saúde. Não queremos mais tratar a doença, mas sim evitá-la, preveni-la. E cada um precisa assumir seu papel nesta mudança.